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Processo:
0000607-27.2024.8.16.0171
(Decisão monocrática)
Segredo de Justiça: Não
Relator(a): Leonel Cunha
Desembargador
Órgão Julgador: 5ª Câmara Cível
Comarca: Tomazina
Data do Julgamento: Sun May 05 00:00:00 BRT 2024
Fonte/Data da Publicação:  Sun May 05 00:00:00 BRT 2024

Decisão Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.

REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000607-27.2024.8.16.0171, DA
VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE TOMAZINA
Autor : GUILHERME CURY SALIBA COSTA
Ré : CÂMARA DE VEREADORES DO
MUNICÍPIO DE TOMAZINA
Relator : Des. LEONEL CUNHA
Vistos, RELATÓRIO

1) Em 21/06/2021, GUILHERME CURY
SALIBA COSTA, pecuarista, ajuizou “AÇÃO ANULATÓRIA
DE ATO ADMINISTRATIVO”, com pedido de tutela
provisória de urgência, em face da CÂMARA DE
VEREADORES DO MUNICÍPIO DE TOMAZINA (mov. 1.1
dos autos originários nº 0000612-54.2021.8.16.0171),
alegando que: a) a CÂMARA, em abril de 2021, após
receber o parecer prévio do Tribunal de Contas do Estado
do Paraná (TCE/PR), deu início ao procedimento para
analisar e julgar as contas prestadas pelo ex-Prefeito do
Município, ora Autor, referentes ao exercício de 2016; b)
“seguindo o disposto no Decreto Legislativo nº 01/2021,
o Autor foi devidamente notificado pela Câmara para
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apresentar defesa, documentos anexos, e a primeira
sessão de análise e julgamento das contas do Poder
Executivo do ano de 2016 foi realizada no dia 26 de abril
de 2021”; c) “na ocasião, o Parecer do TCE/PR foi
rejeitado por 06 votos a 03, com a participação de todos
os Vereadores da Casa de Leis”; d) “após, em 03 de
maio, o Vereador Flávio Oliveira de Farias protocolou
requerimento ao Presidente da Câmara, pedindo
providências quanto à suposta nulidade da primeira
votação, por, em seu entender, ter infringido o disposto
no artigo 164 do Regimento Interno”, sob o fundamento
“da participação, na Sessão de Julgamento, da
Vereadora Neli Couto Ribeiro Saliba Costa – ex-cônjuge
do Autor”; e) o “Presidente da Câmara, diante do pedido,
anulou a primeira votação do Decreto 01/21, entendendo
que o vínculo conjugal, entre a Vereadora e o ex-Prefeito,
ainda existiria, o que se enquadraria no citado artigo do
R.I.”, todavia, “é público e notório que o Autor e a
Senhora Neli Couto Ribeiro Saliba Costa se separaram
em abril de 2019”; f) “inexiste qualquer relação de
parentesco entre os dois que impeça ou cause a
suspeição da Vereadora no julgamento das contas do
Poder Executivo”; g) “desde junho de 2019 o Autor
convive maritalmente com a Sra. Bruna Rafaela Pereira
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do Nascimento, com quem teve um filho nascido em 29
de janeiro de 2021. A relação entre o Autor e sua atual
companheira é pública, com publicação da relação em
redes sociais e convívio no âmbito social da cidade,
residindo desde então (junho/2019) na cidade de
Siqueira Campos, onde mantém núcleo familiar com
companheira e filho, que hoje já conta com 6 meses de
idade”; h) “cumpre registrar que pela teoria dos motivos
determinantes a validade do ato administrativo – no
presente caso a decisão que anulou a sessão do dia
24/04/2021 – está vinculada a existência e a veracidade
dos motivos apontados como fundamento para sua
adoção, de forma a sujeitar o ente público aos seus
termos”; i) “no caso vertente, o motivo indicado como
fundamento é o casamento, a união entre a Vereadora e
o Autor. Ocorre que é público e notório que o casal se
encontra separado de fato há mais de dois (02) anos,
quando deixaram de compartilhar a vida em comum”; j)
“não deve ser aplicado o artigo do Regimento Interno
que deu aso à anulação da Votação, pois a intenção do
legislador, ao prever a impossibilidade de Voto quando
há interesse de cônjuge, á a proteção da
imparcialidade”; k) “considerando que tal união deixou
de existir, o motivo é inexistente”; l) “não bastasse o
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equívoco de fato que causa a nulidade da decisão,
verificasse que, da decisão que anulou a primeira Sessão
de votação, não foi conferido o direito de contraditório
ao Autor, ex-Prefeito, cujas contas estavam sob análise”;
e, m) deve ser declarada nula a “decisão que anulou a
sessão realizada no dia 24 de abril de 2021 e a
necessidade de continuidade do procedimento de
votação e julgamento das contas do Poder Executivo
relativo ao exercício de 2016”. Requereu a antecipação
da tutela provisória de urgência, a fim de que fosse
“suspenso o procedimento de votação do Decreto
Legislativo 01/2021, da Câmara Municipal de Tomazina”,
e ao final, a procedência do pedido, com a “anulação da
decisão que anulou a primeira votação do Decreto
Legislativo 01/2021, da Câmara Municipal de Tomazina,
ocorrida na data de 26 de abril de 2021, reeditando-se,
por corolário, os efeitos do ato da primeira votação que
rejeitou o parecer do TCE/PR, e, consequentemente,
determinar o prosseguimento da análise das contas do
Poder Executivo Municipal, exercício de 2016, em
segunda votação, com a validade do ato de 26 de abril
de 2021, e om a participação e direito de voto à
vereadora Neli Couto Ribeiro”.

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2) A decisão (mov. 25.1 dos autos
originários) antecipou a tutela provisória de urgência, e,
pois, determinou a “suspensão do procedimento de
votação do Decreto Legislativo 01/2021, da Câmara
Municipal de Tomazina, até ulterior deliberação”.

3) A CÂMARA DE VEREADORES DO
MUNICÍPIO DE TOMAZINA contestou (mov. 33.3 dos
autos originários), alegando que: a) “não há como se
negar perante a lei que a vereadora está impedida
realmente de votar. Veja, a declaração juntada pelo
autor de que a autora está separada de fato, não tem
qualquer valor jurídico de desconstituição de vínculo. Se
o autor tivesse apresentado pelo menos um processo
judicial de separação ou divórcio, entretanto sequer o
apresentou”; b) “o vínculo da vereadora Nely com o
autor é tão evidente que ela faz questão de assinar os
sobrenomes Saliba Costa. Além disso, Excelência, o
autor tem filhos com a vereadora Nely. Como a
vereadora poderia ser imparcial neste caso? Não é por
má-fé ou dolo, mas em razão da própria natureza
humana, uma mãe jamais tomaria uma decisão que
pudesse comprometer ou magoar os filhos”; c) “a
decisão aqui pode, digamos, comprometer a herança
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Remessa Necessária nº 0000607-27.2024.8.16.0171
futura dos filhos, pois em caso de manter a reprovação
de contas, numa eventual ação de improbidade
administrativa o autor poderia ter seus bens
confiscados”; d) “não há nada na lei que diga que
separação de fato rompa com o vínculo conjugal do
casamento válido, conforme sustenta o autor”; e, e)
“uma vez iniciado o processo de votação, a partir da
primeira votação, não é necessário a intimação, pois, é
dever do autor, acompanhar o processamento, todas as
sessões da Câmara são públicas e disponibilizadas no
youtube, além do que, o autor contratou advogado e este
devia estar acompanhando”, bem como “tem aliados
políticos entre os vereadores e, com certeza, estes lhe
deram ciência”.

4) As partes manifestaram sobre as provas,
conforme se infere do mov. 44.1 e do mov. 46.1 dos
autos originários.

5) O doutor Juiz anunciou o julgamento
antecipado da lide, conforme se infere do mov. 54.1 dos
autos originários.

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6) A sentença (mov. 66.1 dos autos
originários) julgou procedente, em parte, a demanda,
“declarando a nulidade do Decreto Legislativo nº
01/2021 da Câmara Municipal de Tomazina/PR, ante as
irregularidades formais ocorridas durante o
procedimento administrativo (Ata nº 12 e atos
subsequentes), confirmando-se a decisão liminar, nos
termos da fundamentação”, bem como condenou a
CÂMARA ao pagamento das custas e despesas
processuais e ao pagamento de honorários advocatícios,
fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais).

7) As partes não recorreram da sentença, e
os autos vieram para exame da Remessa Necessária,
conforme se infere do mov. 104.1 dos autos originários.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

A Remessa Necessária, no caso, não deve
ser conhecida, na forma do inciso III, do artigo 932, do
Código de Processo Civil de 2015.

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Constata-se que o Autor e a Ré deixaram de
recorrer, concordando com o entendimento exposto pelo
doutor Juiz na sentença. Isto é, a ausência de
interposição de recurso voluntário da CÂMARA DE
VEREADORES evidencia a conformação com a sentença
que lhe é desfavorável, gerando a presunção de
concordância com a sentença.

Além disso, com o advento do Código de
Processo Civil de 2015, não é toda sentença desfavorável
à Fazenda Púbica que se submete à Remessa
Necessária, uma vez que os parágrafos 3º e 4º, do artigo
496, estabelecem exceções, notadamente,
considerando a preponderância dos princípios da
eficiência e da celeridade.

No caso, além da conformidade da CÂMARA
DE VEREADORES com a sentença, verifica-se que, no
caso, o entendimento adotado na sentença está
fundamentado na violação aos princípios do
contraditório e da ampla defesa, considerando que não
constam dos autos comprovação de que o Autor tenha
sido notificado sobre o requerimento de anulação da
primeira votação. Vejamos:
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“Deste modo, e considerando que os
Parlamentares, ao deliberarem sobre as contas
prestadas pelo Chefe do Poder Executivo, devem
observar, com rigor, as determinações legais
pertinentes, sob pena de nulidade do julgamento,
correta a arguição de nulidade da votação, por
inobservância ao disposto no artigo 164 do Regimento
Interno. No entanto, a votação foi anunciada, conforme
Ata nº 12/2021, sem que fosse oportunizado o
contraditório e a ampla-defesa do autor. As normas
constitucionais relativas à fiscalização pelo Poder
Legislativo não autorizam a realização de procedimento
com violação aos princípios da ampla defesa, do
contraditório (art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal)
e do devido processo legal. O processo para julgamento
das contas prestadas por gestor público perante a
Câmara Municipal e demais atos relacionados deve ser
conduzido de forma a garantir a plenitude da defesa,
desde a citação, publicidade, ampla produção de provas,
argumentação técnica e julgamento. Isto é, diante da
natureza do processo administrativo, a intimação do
gestor para os atos que antecedem ao julgamento é
indispensável, em respeito ao devido processo legal e ao
contraditório. Verifica-se que a anulação foi anunciada
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sem que fosse oportunizado o contraditório e a ampla
defesa (Ata nº 12/2021 – mov. 1.8). Não restou
demonstrado que o autor foi notificado acerca do
requerimento de anulação da votação, e, tampouco,
acerca da data em que seria proferida a decisão. Veja-se
que na 1ª votação, o autor participou da sessão, sendo-
lhe, inclusive, concedida a palavra, o que não ocorreu na
data da decisão pela anulação. Ainda, nova sessão foi
agendada para o dia 06/06/2021 – e realizada –, sem que
a parte interessada fosse notificada/intimada para que,
querendo, apresentasse defesa. Como sabido, a ordem
constitucional institui o princípio do devido processo
legal (art. 5º, LIV) e as garantias fundamentais do
contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV), seja nos
processos administrativos como nos processos judiciais,
o que não ocorreu no presente caso. Nesse contexto,
conclui-se que houve ofensa ao devido processo legal,
uma vez que o autor teve cerceados seus direitos à
ampla defesa e ao contraditório, pois não foi cientificado
acerca do requerimento de nulidade e posterior
anulação” (mov. 66.1 dos autos originários – destaquei).

Vale dizer, portanto, que o entendimento
adotado na sentença está em conformidade com os
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precedentes deste Tribunal de Justiça. Vejamos:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO
ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO. REPROVAÇÃO
DAS CONTAS PELA CÂMARA MUNICIPAL DE FOZ DO
IGUAÇU. EXERCÍCIO 2005. DECRETO LEGISLATIVO Nº
02/2017 E DECRETO LEGISLATIVO Nº 09/2017. AUTOR
QUE NÃO FOI INTIMADO DAS DATAS PARA A REALIZAÇÃO
DAS SESSÕES DE JULGAMENTO. POSSÍVEL PREJUÍZO À
DEFESA. CERCEAMENTO DE DEFESA. GARANTIAS
CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA
DEFESA. O direito ao contraditório e à ampla defesa
possui respaldo jurídico no art. 5º, inciso LV, da CF/88,
dispõe que aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral, são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os
meios e recursos a ela inerentes, devendo, por isso, ser
disponibilizado todas as provas existentes contra o
acusado. RECURSO PROVIDO” (TJPR - 5ª Câmara Cível -
0060747-94.2020.8.16.0000 - Foz do Iguaçu - Rel.:
DESEMBARGADOR NILSON MIZUTA - J. 08.03.2021 -
destaquei).

“(...) AÇÃO DECLARATÓRIA DE INVALIDADE
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DE ATO ADMINISTRATIVO. PRETENSÃO DE INVALIDAÇÃO
DO DECRETO LEGISLATIVO Nº 007/2011, DA CÂMARA
MUNICIPAL DE ANTONINA, O QUAL REPROVOU A
PRESTAÇÃO DE CONTAS DO MUNICÍPIO, EXERCÍCIO
FINANCEIRO DE 2003. PROCESSO LEGISLATIVO QUE NÃO
OBEDECEU OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO
CONTRADITÓRIO EDA AMPLA DEFESA. AUSÊNCIA DE
INTIMAÇÃO DA EX-PREFEITA SOBRE A DATA EM QUE AS
CONTAS SERIAM JULGADAS E, TAMPOUCO, NOTIFICAÇÃO
FORMAL PARA SE MANIFESTAR SOBRE O PARECER
PRÉVIO QUE JULGOU IRREGULAR APRESTAÇÃO DE
CONTAS DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. (...)
RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO”
(TJPR - 4ª Câmara Cível - 0002662-59.2015.8.16.0043 -
Antonina - Rel.: DESEMBARGADORA REGINA HELENA
AFONSO DE OLIVEIRA PORTES - J. 01.11.2018 -
destaquei).

Nessas condições, não se conhece da
Remessa Necessária, considerando a conformidade da
CÂMARA DE VEREADORES com a sentença,
notadamente, considerando a preponderância dos
princípios da eficiência e da celeridade, visto que o
entendimento adotado na sentença está em
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Remessa Necessária nº 0000607-27.2024.8.16.0171
consonância com os precedentes deste Tribunal de
Justiça.

ANTE O EXPOSTO, nos termos do inciso III,
do artigo 932, do Código de Processo Civil de 2015, não
conheço da Remessa Necessária.

Intimem-se.

Após, arquivem-se.

CURITIBA, 03 de maio de 2024.

Desembargador LEONEL CUNHA
Relator